quinta-feira, 22 de outubro de 2015

Noites Brancas com Electric Lo Fi Seresta - Entrevista

Uma historinha básica pra introduzir, Guilherme Almeida muito antes de meu amigo, é há mais de dez anos guitarra e voz de um dos guerreiros e sobreviventes do submundo dos bons sons deste país, pra quem ainda não entendeu, estamos falando da grande The John Candy.

Introdução feita, vamos ao ponto, não é de hoje que o Guilherme tem um alter ego que atende pela alcunha de Electric Lo Fi Seresta, os motivos disso, eu sugiro que você leia a entrevista abaixo, mas só para situar, tem a ver com seus sonhos, deja vu´s e memórias evocando suas reais raízes.

Sonoramente, o TBTCI situa o Electric Lo Fi Seresta como algo que a Sarah deveria ter lançado mas jamais lançou, e note bem, é sabido que a gravadora das pop songs perfeitas não faz lá muito a cabeça deste que vos escreve, mas o ELS vai bem além de simples dreampop songs, uma aura hipnótica move os sonhos de Guilherme, pegue seus eps e singles anteriores ou se preferir vá no primeiro álbum Ao Vivo Sem Vocês (It Was Nothing Personal) de 2013 e entenda, ou melhor sinta.

Mas um passo esta sendo dado, e ao meu ver corretíssimo, já que infelizmente o que o ELS faz não é nem de longe valorizado por essas terras, o novo álbum sai daqui uma semana pela gravadora inglesa Dufflecoat Records, o que de fato é absolutamente merecido, e o TBTCI endossa este lançamento uma vez que a envolvente e suave música do ELS certamente sera melhor valorizada.

Se por acaso você aprecisa Durutti Column, Go-Betweens, The Chills e afins, não perca mais tempo e apaixone-se pelo Electric Lo Fi Seresta.


***** Entrevista com Electric Lo Fi Seresta *****


Q. Quanto tudo começou? Porque Electric Lo-Fi Seresta, qual a origem do nome?
Como você sabe, há mais de 10 anos estou na estrada como guitarrista e vocalista da The John Candy. Mas o que quase ninguém sabe é que faz pelo menos 20 anos que componho e gravo outras coisas em meu cantinho, sem grandes pretensões, para mim mesmo, transitando por outras sonoridades que amo igualmente. Raramente piso em um pedal de distorção com o Electric Lo-Fi Seresta, por exemplo. De 2012 para cá fui resgatando algumas composições que eu havia registrado em fitas K7 caseiras nos anos em que morei em Paquetá, entre 1996 e 1999, e senti vontade de finalmente gravá-las para valer. Esse resgate de composições quase esquecidas somadas a algumas músicas novas que vim acumulando desde então, de sonoridade mais “jangly” do que propriamente “noise”, foram dando forma ao Electric Lo-Fi Seresta. Quanto ao nome, o motivo são as minhas raízes em Campos (interior do Rio), onde nasci e cresci. Minha família não é nem do centro da cidade, são da roça mesmo, um lugar quase “fora do mapa” chamado Poço Gordo. Nasci lá e vim adolescente para a capital. Sempre que vou visitar meu pai, me entretém o movimento em direção às serestas locais, algumas regadas à cachaça e alambique, e te digo que normalmente a lua e o céu à noite em Poço Gordo fazem qualquer seresta ganhar contornos de um videoclipe do Cocteau Twins! Como seriam as serestas do interior caso fossem embaladas, além da cachaça e do luar esplendoroso, com Smiths ao invés de Nelson Gonçalves, os discos da Sarah Records e o dreampop oitentista ao invés de Dilermando Reis, Durutti Column ao invés de Altemar Dutra? Esse é um dos delírios que move o Electric Lo-Fi Seresta.

Q. Quais as suas influências?
Pensando especificamente no ELS, tudo da Sarah Records e da Flying Nun Records lançado durante na década de 80, Beat Happening, Durutti Column, Flying Saucer Attack. E um pouco de Chris Montez, alguma coisa de João Gilberto também, mas à minha maneira, quase ninguém percebe isso.

Q. E sobre a atual cena parece que estão nascendo bandas em tudo que é esquina, quais bandas da nova geração você recomenda?
A lista é interminável e ser injusto neste caso infelizmente é inevitável. Falando de novidades brasileiras que me chamaram atenção este ano, tem o No Crowd Surfing do Paraná, também gostei do recente EP do Céus de Abril, além do misterioso The Dream Pop Project, a “resposta brasileira ao Radio Dept”, se isso fizesse algum sentido, hehe... Das estrangeiras, tem o Arctic Flow, que acompanho desde o começo e tem lançado uma coisa mais bonita que a outra dentro do universo dreampop/jangly/shoegaze nos últimos cinco anos.

Q. Por que tem tanta banda bacana e mesmo assim tem pouca gente nos shows, poucos picos pra tocar, qual a sua opinião sobre o assunto?
A falta de curiosidade e de sensibilidade foi se agravando não apenas com o excesso de informação disponível virtualmente, mas também com a incorporação do que tem de pior do comportamento da cultura “mainstream pop” para dentro do universo dito “independente”, dele derivado: ou seja, a necessidade de um hype ou de um respaldo prévio para os “indie kids” se interessarem por uma banda, consumindo música como quem “agrega valor” a sua identidade suposta de “pessoa diferente da norma” (mas, na verdade, totalmente dentro dela). A facilidade do acesso não implicou em larga escala na mudança de uma percepção e seleção musical “tutelada”. Mas isso é só um lado da questão, evito julgar as causas por esse que é apenas um dos efeitos. O buraco é bem mais embaixo.

Q. O novo álbum vai sair pela gravadora inglesa Dufflecoat Records certo? Como foi o processo de gravação novo álbum?
O novo álbum, “Noites Brancas”, já está em pré-venda no bandcamp (http://electriclofiseresta.bandcamp.com, incluindo dois downloads para quem comprar antecipadamente) e sai na íntegra pela inglesa Dufflecoat Records no dia 28 de outubro em formato digital, no esquema “name your price”. No primeiro semestre de 2016 sairá o compacto 7 polegadas de Noites Brancas/Everything (She Does) por aqui, pela Juvenilia Records. O processo de gravação foi bem rápido. O Joab Regis, que já toca comigo no John Candy, tem me acompanhado nos shows e gravou as baterias no Escritório da Transfusão Noise Records. É o garoto-bateria nota 10 da Transfusão. Em dois dias gravei as guitarras e as vozes. O Lê Almeida produziu e mixou o álbum, enquanto que Vinicius Leal, “aquele que não deixa o artista mão”, masterizou. Gostei bastante do resultado final, sou grato ao Lê e ao Vinicius por terem entendido e viabilizado a sonoridade “dreampop de rádio AM em motel do interior” que eu desejava para este álbum novo.


Q. Qual a dificuldade na sua opinião do Electric Lo-Fi Seresta e obvio outras bandas serem realmente valorizadas por aqui? (Vide que o disco só saira na gringa)
É, de fato foi mais fácil lançar esse disco (com o mínimo de atenção que acho que ele merece) por um selo gringo do que por aqui... é um tema complexo e difícil de ser sintetizado sem parecer unilateral e simplista. Então, para não ser repetitivo em relação ao que todo mundo já diz, vou tocar em tabu que me parece pouco dito de frente e às claras, fazendo, às vezes, a meu ver, a diplomacia rimar perigosamente com a hipocrisia: existem selos independentes brasileiros que há tempos vem incorporando o pior das antigas grandes gravadoras. Imagine se realmente tivessem a influência e o poder que acham que tem, iludidos pelo puxa-saquismo dos amigos... seriam piores que o jabá da Som Livre com o Chacrinha! O desejo de auto-promoção e a formação de “panelas media training” com tal finalidade aos poucos vai vencendo a curiosidade descompromissada em promover bandas novas e desconhecidas. Em alguns casos, felizmente são poucos (mas emblemáticos), é como se fosse as bandas que agora tivessem de promover os selos, e não o inverso... Cada um dá a direção que quer ao que faz, claro, mas querer tirar onda de vanguarda independente et cetera e tal, quando nos bastidores sabemos que a postura não é essa, mas frequentemente de arrogância, é de lascar. Isso existe em qualquer lugar do mundo, eu sei. Mas me parece que existe também um modo “à brasileira” de funcionar dessa forma e dada a limitação dos espaços independentes por aqui, acaba sendo mais danoso do que em países onde há mais espaço para todos na cena cultural alternativa. Contudo, não gasto energia me preocupando com isso. Fico ao lado da ação e jamais da reação, e esta questão quando me chama atenção, como agora, é mais por seu aspecto exemplar de “psicologia social” do que propriamente como músico.

Q. Quais os 5 melhores álbuns da história para você?
Eu sabia que viria a pergunta mais difícil do universo! Sendo bem tendencioso, malicioso e irresponsável:
Brighter – Laurel LP
East River Pipe – Mel
Flying Saucer Attack – s/t “Rural Psychedelia”
Durutti Column – LC
Radio Dept – Pet Grief



Q. Quais os planos pro futuro, o que esperar do Electric Lo-Fi Seresta?
Não pretendo fazer muitos shows com o Electric Lo-Fi Seresta, mas pretendo sim fazer alguns para divulgar o novo álbum. As gravações certamente não pararão, são necessidades fisiológicas que a mim se impõem. Porém, não tenho expectativas que me façam esquecer que hoje, talvez mais do que em qualquer outro tempo passado, a infâmia e a glória, mesmo aquelas relativas e circunscritas a um restrito nicho como o nosso, obedecem rigorosamente ao mesmo registro casual e contingente. Além disso, a infâmia tem muitas vantagens, a liberdade e o prazer com cada segundo daquilo que você produz são duas delas.

Q. Alguma coisa a mais para nos contar?
A gente se vê em SP ainda este ano, só digo isso! Também faço questão de dizer obrigado a você, Malizia, pelo convite da entrevista; os cada vez mais felizardos que acompanham o sincero e dedicado trabalho do TBTCI, revirando a música independente de verdade, aquela que vem pelas margens e pelas beiradas, só tem a torcer para que suas teias sonoras abracem cada vez mais longe o submundo dos bons sons.
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Obrigado  Guilherme

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