Não acredito em cena nacional underground, prefiro crer que existem movimentos isolados tipo no RS, temos a Transfusão, a Sinewave, e temos uma caralhada de bandas dispersas tentando criar algo relevante e inovador, e vou ser sincero, a ebulição da cena underground do underground nacional esta realmente recheada de ótimas bandas, mas infelizmente aqui no Brasil as coisas caminham de forma desconexa porque quem comanda a musica usualmente não entende absolutamente nada de musica, e o trabalho dos musicos e suas bandas são dificies, inumeros reveses e inumeras acabam sucumbindo pelo sistema hipocrita.
Agora em contrapartida me deixa extremamente orgulhoso, saber que algumas bandas fogem do amadorismo e da mesmice e criam algo absolutamente inovador, com conteudo e com conceito proprio acima de tudo, pessoas que realmente acreditam que possa existir qualidade fora o amadorismo latente que é notorio quando falamos de underground.
Uma dessas bandas atende pela alcunha de Sobre a Maquina, pequeno intervalo aqui, tomei conhecimento através do Fernando da revista online Floga-se onde ele me disse, Renatão ouça isso, é indigesto, quero ouvir tua opinião a respeito. Ok, demorei um pouco mas acabei ouvindo após um bate papo com Cadu Tenorio um dos mentores da banda, e fiquei literalmente chocado, aqueles drones, me foderam literalmente, Lingua Negra a faixa de abertura do EP Areia é algo fora do contexto atual da musica nacional seja alternativa ou não, o experimentalismo explicito é decupado pelos integrantes de forma minuciosa e perfeccionista, cada detalhe, cada nuance é sentida a cada audição. Lingua Negra é extremamente dificil de ser analisada friamente, Einstürzende Neubauten, PIL, Throbbing Gristle, Krautrock, leia-se NEU! pode ser o que vem primeiramente a cabeça ouvindo isso, acrescente os loops e drones do Loop, a perversão do Suicide, Mogwai, mas veja vem isso não é post rock, isso é post industrial, post sei lá o que é inqualificavel , se é que a palavra existe, o som do Sobre a Maquina e a obra prima Lingua Negra.
Se você conseguiu passar pelo choque de Lingua Negra, o clima torna-se mais ameno em Barca, durante minha primeira audição comentei com o Cadu, que me lembrou absurdamente o Durutti Column, e após ver o que ele proprio escreveu reafirmo, seria algo como se Vini Reilly fizesse um duo com Blixa Bargeld, um clima de desespero clamando saudade ronda a musica inteira....ainda temos Foz e Garça, que segundo Cadu é a resumo do Sobre a Maquina.
Simplesmente um dos melhores albuns nacionais que foram lançados em muito muito tempo, sem contar na parte da arte que é um conceito a parte....Ah sim vale ressaltar que teremos uma rara oportunidade no da 21/01/2012 de poder conferir o poder sonoro do Sobre a Maquina aqui em São Paulo.
E mais, convidei Cadu para realizar um track by track do Areia para que o TBTCI e todos os interessados possam adentrar mais e mais no mundo pessoal do Sobre a Maquina. Aproveitem.
Track by Track com Cadu Tenorio - Sobre a Maquina "Areia"
Bem, idéia interessante do Malizia me convidar pra escrever um faixa a faixa do Areia. Começo isso dizendo que não costumo pensar minha produção sonora a partir de outros trabalhos, não passa pela minha cabeça reproduzir, muito menos referendar explicitamente nenhum outro trabalho artistico. Tenho por mim o desejo - talvez idiota, talvez não - de fazer um som próprio. Agora é inegável que muita coisa influencia esse processo. Desde a formação músical, o que você ouve, o que te agrada até suas visões de mundo. Enfim, vamos tentar aqui, de forma breve e sem delongas.
Língua Negra
Essa música foi idealizada por ultimo no contexto do disco, mas desde o ínicio pensava que precisaria de uma faixa como ela para abrir. Queria que ela seguisse um groove hipnótico através de uma percussão tensa e pesada, porém minimal, algo que fosse uma espécie de saída do Decompor... Synths e vozes jogados de forma doentia por cima criando os ápices e climas. A batida tinha que ser especial, tive a idéia de montar um set de percussão metalizada que junto aos efeitos fizesse a base hipnótica desse som, as microfonias foram feitas a partir de manipulação do volume para com a sala. A música concreta e o early-industrial do Neubauten, SPK e Throbbing Gristle sempre fizeram minha cabeça, e não teria pensado nessa batida tocada com uma velha bomba de bicicleta, um triângulo(sim o instrumento de forró e samba) e a base de aluminio de um ventilador. Unimos isso a microfonação com reverb e delay milimétricamente dosados e conseguimos o resultado desejado. Considero o riff de baixo de fato hipnotizante, impossível negar as raízes que pelo menos ao meu ver viriam do Joy Division, apesar de tudo. Ela é o abre alas do cd porque de certa forma desemboca como uma "língua negra" no que está por vir haha. O climax ou o final, como preferir, acabou virando algo que me remete de leve à trabalhos como os do Fennesz e Tim Hecker, é o único momento onde uma guitarra tocada com o delay invertido surge pra complementar os synths. Ao meu a música não poderia terminar diferente cai como uma luva no Início de Barca. Creio que o Kraut do Faust e o Can tenham sido boas influências pra esse disco também.
Barca
Foi a primeira faixa a ficar pronta. Foi criada num momento de muita saudade. De certa forma tenho que admitir que é uma música "romântica" à seu modo caótico e inconformado haha. As percussões e sons metálizados gerados pelo desnível do ventilador com o chão de mármore - as velocidades do ventilador o faziam tremer e bater com as "pernas de base" desníveladas nesse chão criando um som motorizado bem interessante -. Esses sons foram gravados com um condenser próximo ao chão, eu e Emygdio resolvemos cobrir tudo - ventilador, barras de ferro -, inclusive nós mesmos com um edredom pra abafar a ambiência externa, enquanto rolava o feedback natural dos motores e batidas no chão tocamos as barras de aluminio e aço inspirados pela violência sonora das velhas barcas que atravessam a baía de guanabara - costumo fazer essa travessia Rio/Niterói com certa frequência e sempre fico fascinado, pra quem não conhece é algo assustador o som dessas barcas, como seria quase impossível gravar o som direto de lá com qualidade, resolvemos criar algo inspirado naquilo. A travessia em sí foi minha inspiração, a baía é um contraste de beleza e degradação intensa que é mais ou menos a balança que pende nessa música. O tema de piano bem simples e quase onipresente costura toda a loucura berrante das guitarras e dos sintetizadores. Tudo culmina num ápice que considero emocionante haha, a bateria é uma das que mais demorei a fazer na história da banda, prestando atenção ela contém muitos detalhes porque foi a junção de três baterias construidas e mixadas por lados diferentes em volumes e velocidades também diferentes. Parando pra analisar as influências que poderia tirar pra faixa, pode-se dizer que são o industrial do Throbbing Gristle e o drone de Tim Hecker, mas pensando agora também me traz de leve a lembrança alguns trabalhos como os do Richard D. James(Aphex Twin). As referencias de timbre pro riff sabbathico lentíssimo do final - gravado pelo Gameiro - foi o Sunn O))). Curioso que foi muito dificil mixar esse final da forma que eu gostaria, a guitarra com a referencia de timbre inicial engolia tudo, tivemos que nos desdobrar pra dar vazão a tudo, aos synths do ápice, as leves variações de clima nos pianos(são dois timbres fazendo uma dobra), a descontrução da bateria e a segunda guitarra que fazia o noise drone pontual, sendo que tudo acontecia ao mesmo tempo como uma mudança brusca. No fim acho que alcançamos a melhor forma possível até o momento, a música nos satisfaz muito, e é curioso como ela consegue soar agradável até mesmo a quem não tem nenhuma familiariadade com as influências da banda. Gosto muito também da linha de baixo que não muda em momento algum, pontuando as mesmas notas bem GRAVE haha.
Foz
Tinha ela toda pronta, os synths e a bateria, seria um groove intenso e tenso, pensei que ficaria lindo, um riff de baixo pontuando uma espécie de groove orquestrado pelos synths e bateria, então o Emygdio traduziu num riff que caiu como uma luva, trabalhamos bem no timbre deleo mais ENFERRUJADO possível - - no geral temos uma preocupação grandiosa com todos os timbres, sempre -, a idéia de investir na hipnose veio com as harmonias de voz improvisadas que gravamos, elas deveriam criar o clima em contraponto a guitarra que seria o fundo, guitarra essa improvisada pelo Emygdio sob condições de extrema exaustão pra ficar o mais claustrofóbica possível(as vezes achamos legais esses métodos que pra muita gente são bobos haha) com tudo isso desenvolvido uma segunda guitarra vai surgindo em loop alterada freneticamente no pedal de delay, tentamos gravar em vários takes essa guitarra, o Gameiro gravou várias vezes até acharmos que estava no ponto. Há também barulhos sutis feitos com coisas sutis como estalos de dedo e coisas do tipo espalhados que vão descontruindo a coisa toda. Na época achamos a sonoridade sensacional e esse amontoado de detalhes deixaria a música cada vez mais cheia, de uma forma não gritante, sem perder a idéia hipnótica e tornaria ainda mais impactante o encontro com o outro rio, um extremo totalmente oposto. Mudanças nas modulações dos synths e duas guitarras num dedilhado dissonante tranquilo, seguidas de perto por uma linha de baixo pulsante e um sax tenor quase smooth jazz e estranhamente tocado como se fosse uma flauta transversa pelo querido Alexandere Zhemchuznikov é a redenção completa. É uma música e tanto, foi a única disco que trabalhamos todos de fato juntos nas idéias, Emygdio e Ricardo contribuiram com ótimas melodias. E ela seria a síntese desse contraste entre o caos e calmaria. Referências de Kraut e do industrial continuam ali, mas há uma lembrança ao jazz... Pasamos muitas madrugadas gravando cada detalhe. Há quem diga que é uma música com cores. haha
Garça
O tema central dela existia antes mesmo de Barca, mas as nuances não. Nessa música o teor jazzístico é explícito. Ela funciona como o ápice do disco inteiro. O timbre do Rhodes é tenso. A batida é seca, minimal, envolvente, como tinha que ser, arrastada. Avaliando aqui agora vejo influências de drone, jazz e claro do early-Industrial. Percussão com latas e tudo em prol do clima, baixo e piano andam juntos firmemente costurados pela bateria enquanto todos os outros elementos improvisam livremente sobre o tema adotando uma postura de quase silencio, envolvendo. A primeira guitarra que entra faz um drone que remete a Morricone quase que sem querer. E daí pra frente o drone toma corpo e vai até não restar mais nada, tudo acaba, devagar, e que sobre é o caos. O cimax é a parte mais intensa do disco, não saberia traduzir ele em palavras, os riffs tanto do teclado quanto da guitarra são pesados e hostís, uma segunda guitarra chora acompanhando o sax tenor desgovernado tocado numa levada "Brotzmann". Se tivesse que achar alguma banda pra referendar diria que é uma cruza entre o Coil e o próprio Brotzmann. Um fato curioso é que o sax foi gravado acompanhando apenas os temas de piano rhodes e a bateria todo o arranjo posterior foi construído por címa.
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Obrigado Cadu!!
http://www.blogger.com/post-create.g?blogID=3704281818281367352
http://sobreamaquina.bandcamp.com/
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Obrigado Cadu!!
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